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Agroecologia ocupa a cidade

Publicado em 25 de Janeiro de 2018 às 14:44

Agroecologia ocupa a cidade

O debate sobre alimentação saudável, preservação do meio ambiente e troca justa tem cada vez mais ganhado espaço no meio urbano, o que reflete em opções para quem deseja consumir comida de verdade e contribuir para o manejo sustentável dos recursos naturais, bem como fortalecer os empreendimentos econômicos solidários, como as feiras agroecológicas.

Em Montes Claros, desde 2016, a Cooperativa dos Agricultores Familiares e Agroextrativistas Grande Sertão (CGS) realiza a Feira Agroecológica no Solar dos Sertões. Todo segundo sábado do mês, a população do município tem a oportunidade de conhecer os sabores e saberes dos grupos comprometidos com o cultivo de alimentos livre de agrotóxicos e conservantes químicos. Além da comercialização de produtos agroecológicos, também são servidos aperitivos e pratos feitos a partir de ingredientes que valorizam a alimentação como cultura e tradição.

"A gente apresenta para a população um produto com valor social, econômico e ecológico agregado”, reforça Aparecido Alves, diretor presidente da Cooperativa Grande Sertão. “Então, a pessoa vai consumir produtos que geram vida e saúde, além de contribuir com as famílias que estão lutando para sobreviver e manter o Cerrado e a Caatinga em pé”, completa.

Maria Madalena Oliveira Leite, mais conhecida como Dona Nenzinha, agricultora familiar da comunidade de Pinheiros, município de Montes Claros, e sócia da CGS desde seu início (2003), produz milho, feijão, mandioca, cana, frutas e hortaliças. “Eu tenho o maior orgulho do meu pedacinho de chão, é um valor muito grande, não tem nada que paga, pois ali consigo produzir de tudo um pouco pra alimentar. A gente não preocupa em produzir em grandes escalas, e sim com qualidade, sem veneno, para as pessoas se alimentarem de verdade. O que é produzido em larga escala não alimenta de fato o povo. O povo só come, não alimenta.”, exclama. “E participar da Feira é uma maneira de valorizar nosso produto e de oferecer comida de verdade às pessoas, pois da mesma forma que queremos o bem pra gente, pra nossa família, também queremos passar isso para o próximo com o mesmo carinho”, acrescenta.

Anteriormente, a maior parte da produção de Dona Nenzinha era destinada ao Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), porém, com a redução do investimento nessa ação, hoje a agricultora abastece apenas a Feira Agroecológica, alguns restaurantes e sacolões em Montes Claros. “Se eu não tenho determinado produto que o cliente deseja, levo os dos vizinhos e amigos que também produzem de forma natural. Aqui na feira, o dia em que não consigo vir, os outros sócios vêm no meu lugar, e o inverso também acontece. Hoje mesmo estou representando aqueles que não puderam vir e estou vendendo seus produtos. Dessa maneira fortalecemos o elo da agroecologia.”, contou, durante a primeira Feira Agroecológica de 2018.

Ação em rede

Além da venda dos produtos da cooperativa e de seus associados, a Feira Agroecológica ainda contempla outros grupos engajados na produção de alimentos naturais. Para José Janser Freire, coordenador técnico da CGS, a Feira “tem papel fundamental no Norte de Minas, porque além de possibilitar a sobrevivência no Cerrado e na Caatinga, dinamiza a economia local ao trabalhar com outros grupos, e dá mostras de que é possível estar no mercado sem praticar capitalismo selvagem. Então, a Cooperativa é um exemplo vivo de que a economia solidária no sertão norte mineiro é possível”.

A projetista Ângela Maria Ferreira Braga, criadora da marca Sabores Vereda, enxergou no beneficiamento de produtos agroecológicos uma alternativa para a falta de emprego. As geleias, molhos de pimenta e conservas são preparadas a partir dos ingredientes cultivados em seu quintal, como pimenta, pepino, cebola, alho, tomate e temperos. “Participo da Feira há quase dois anos. Além de cooperar com a renda familiar, é uma oportunidade de divulgar nossos produtos e conhecer pessoas novas. É uma diversão, um trabalho que fazemos com prazer”, revelou.

Na avaliação de Felício Figueiredo, da Cooperativa Camponesa Veredas da Terra, ligada ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, a Feira representa um positivo canal de comercialização. Os principais produtos oferecidos são a Cachaça Veredas da Terra, a polpa de tomate orgânico, os cafés, o arroz integral e os sucos. “O público que frequenta sabe da missão que a gente tem, é apoiador do movimento, então nos sentimos muito à vontade estando aqui no Solar”, declarou. “Apesar da crise política e financeira que temos enfrentado, esperamos prosperar em 2018, pois temos percebido uma expansão significativa do mercado de orgânicos aqui no município”.

Além da Feira Agroecológica, a Cooperativa Veredas da Terra também abastece o Armazém do Campo de Belo Horizonte, empório do MST inaugurado no mês de novembro de 2017. “Daqui do Norte de Minas, os produtos que vão para lá são a polpa de tomate, a cachaça, o licor e a geleia de umbu, além das hortaliças, quando temos a capacidade de logística para transporte de alimentos frescos”, explicou. “Dessa forma mostramos para a sociedade o que o MST produz e que sabemos fazer um trabalho de qualidade”.

Alimentação como ato revolucionário

Quem frequenta a Feira, além de se beneficiar do poder nutricional dos alimentos agroecológicos, tem a consciência de estar contribuindo para um mundo mais justo e fraterno. O professor João Paulo Antonini, que visitou o espaço pela primeira vez em janeiro de 2018, ponderou: “Achei a Feira muito interessante e necessária, uma vez que mostra à sociedade, como um todo, sobre o papel da agroecologia e do extrativismo sustentável e a importância desses dois elementos para a preservação ambiental, trazendo consigo o desenvolvimento econômico”.

Para a estudante universitária Nívea Martins, que já frequenta a Feira há quase dois anos, os benefícios do consumo de produtos agroecológicos vão além da alimentação saudável, da conservação do meio ambiente e dos modos de vida das populações tradicionais: “Aqui eu consigo conversar com a pessoa que plantou, com a pessoa que fez, consigo saber a origem dos alimentos, o que não acontece com um produto industrializado de supermercado, cuja compra é uma relação fria. Então aqui é possível ter uma troca energética muito significativa. Ao mesmo tempo, pelo fato de o Solar ser um local histórico e inspirar a gente a lembrar das nossas raízes, a feira em si proporciona reencontros de pessoas, de amigos, e nos mostra como é preciso valorizar o povo da nossa terra, ao invés de grandes empresas”.

Sobre a Cooperativa Grande Sertão

A Cooperativa Grande Sertão é um empreendimento econômico solidário do Norte de Minas formado por agricultores e agricultoras familiares, agroextrativistas, assentados e assentadas da reforma agrária, quilombolas e indígenas. São populações tradicionais que têm como foco o uso e manejo sustentável do Cerrado e da Caatinga, prática que favorece o trabalho com produtos da sociobiodiversidade, gerando renda e, ao mesmo tempo, conservando o meio ambiente e respeitando a sabedoria das populações nativas. A CGS também trabalha com itens oriundos dos quintais agroecológicos, com o intuito de fortalecer a qualidade da alimentação das famílias agricultoras e oferecer uma fonte de recursos por meio da comercialização da produção excedente. Dentre os principais produtos, estão 17 variedades de polpas de frutas, como também óleo, polpa e congelados do pequi. Óleo e farinha de buriti, rapadurinha, açúcar mascavo, farinha de mandioca e mel. Tudo natural, extraídos de frutos sem o uso de agrotóxicos, sem adição de água e conservadores químicos.

Hoje a Cooperativa conta com uma unidade de processamento de frutas, a 40 km do centro da cidade de Montes Claros, que tem o papel de receber e centralizar toda a produção dos/as agricultores/as associados/as do Norte de Minas. Conta também com um centro de distribuição e fábrica de processamento de multióleos (buriti, macaúba, gergelim, mamona, maracujá, girassol, amendoim), localizado no Distrito Industrial do município. Além desses dois espaços, existem unidades comunitárias que cumprem o papel de inicial de organizar a produção: primeira seleção, lavagem e armazenamento em embalagens adequadas para o transporte até a unidade de processamento de frutas.

Quer saber mais? Assista ao vídeo abaixo e conheça um pouco mais sobre o trabalho da Cooperativa: 


Postado por: Paula Lanza Barbosa
Editado por: Paula Lanza Barbosa